segunda-feira, 27 de julho de 2009

insano

não faz sentido manter toda essa emoção, esse sentimentalismo barato, esse monte de advérbios graciosos em prol do que sempre se esfria, se esvai. não sou romancista, não sou dramaturgo, muito menos escritor, se é que eles não se confundem. não sou. estou longe desse universo. as artes se afastaram de mim, imobilizaram-se todas em suas imagens patéticas e melodiosas. amar em vão, isso jamais. somente na ruína, no fim, no término amargo do sim. aquele não que invade o corpo e agarra febrilmente o coração, estirpando-o da conjuntura, apertando-o, dilacerando-o até saírem as lágrimas nos olhos. uma falta de ar, a perda de tato e de noção do tempo. e a vontade terrivelmente assustadora de morrer. de pôr fim a tudo que se faz material e palpável. pura poesia, romance. chega a ser bonito. e chega de ser bonito. não quero. não posso deixar que me ludibriem as palavras, essas traidoras, essas tão vis figuras capazes de me dividir ao meio, de me fazer sentir a sua intensidade, de me cegarem diante do belo. são dissimuladas, elas, as palavras. não me renderei ao seu encanto. estou dissecado, gélido, árido, fosco, sem textura. cansei dessa farsa. cansei. admitirei até o fracasso. ao menos não serei um fracassado covarde, tênue. o que foge das verdades e se distrai com as mentiras. não dançarei, não encenarei, não serei um criador de coisas. isso não se faz de forma honesta. é dessa brutalidade toda, desse rol de cores singelas, que vem a inspiração dos traidores, dos que criam, recriam e exterminam suas criaturas. ênfase no criar. não posso, não quero e não devo. esse proceso doloroso e ardil, o que queima de forma líquida e se funde no âmago do espírito. quero a distância disso tudo, quero negar o ridículo da liberdade. não me venha com esse jogo, essa dissimulação infantil de quem acredita em sonhos. acabe com o silêncio. estou farto, exausto, comprimido num espaço sufocante. quero a falta de ar de quem corre e não a de quem ama. aquelas palavrinhas bonitinhas de outrora podem se resumir à insignificância do que traduzem, porque agora eu vou querer os palavrões. essas grandes palavras cheias de raiva, furiosas por si, que não carecem de complemento, que ecoam sem esforço. serei do intransitivo, somente dos verbos. não quero rimas, não quero. vou empapar de suor a testa, as costas, o peito e todo o resto que sue. vou transpirar realidade, no esquecimento vulgar dos nomes e dos números, na convenção do arcaico modo burguês de ser e me embriagar sem causas nobres. vou abusar do álcool sem virtude, somente para esquecer que um dia amei, que fui um idealista. não terei ideais, serei um sem-ideias. contentarei-me com o pouco. participarei dessa banalidade toda que acontece diariamente nos quatro cantos do mundo, sobretudo aqui. aqui nesse universo de gente hipócrita e medrosa como eu. na sujeira, nessa imundície toda que causa a preguiça e a falta de coragem. a rotina de quem se acotidiana na mesmice de suas mesmas meias. das meias verdades. a falta de um cigarro numa noite insone. a merda de sempre ser a mesma coisa. fétido demais, valioso de menos. personificarei a vaidade, essa luxúria rica de tão pobre. serei egoísmo e individualismo de uma só vez. é mais fácil ser assim, mais viável, essa postura única, unilateral, rasa, superficial. sem inteligência, sem arrebate, sem o som de tudo que vai além dos ouvidos. então nega-me com violência, rasgando as folhas do enredo escrito. joga-me no bloco de notas, nos afazeres banais, na vontade de sexo proibido. esse assunto popular ainda tão cheio de pudor. deixa que a mediocridade substitua o caráter dos honestos, esses parcos sujeitos coadjuvantes. e faz com que tudo em volta seja exato, desumano, sem cortinas a separar os bastidores do palco. anota em letras garrafais o meu pedido, o de querer ser normal. e lê pra mim, em voz alta, o diagnóstico psiquiátrico de que surtei.

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