segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

um castelo de cartas. uma paixão instantânea.


e foi apenas mais uma. eu também, mais um. personagem efêmero. sendo piegas em nome e sobrenome. dançando tango no meio do asfalto. quase cego às cores mortas. declamando poesia em plena roda de prosa. esquecendo as dores de moribundo eternamente frustrado. um coadjuvante, dos que se esquece já na cena seguinte. febrilmente sonhando com um enredo a mais. sóbrio em seu esforço de conquista de espaço. com meias-palavras sinceras e intensos versos a brotar de antigos escritos. que euforia insone, incontáveis vezes a perturbar-me, atiçando o emplastro outrora arranjado por meu lado racional. que bobagem a crença. que frívola a esperança. ela bem diante de sua peça, de sua trama. sentia-se a protagonista. e era. quanto a mim, o ‘sem-nome‘. o tipo gato aos pés da dona. ludibriou-me. encantou-me. não sei ao certo se estava mesmo fora de si. sua desenvoltura estonteante, não de beleza crua, mas de conteúdo, criava um paradoxo com sua segurança mitigada. revelava-se aos poucos. e semelhante à lua quando muda de formato, variava de humor. interpretava, impecavelmente, cada fala. e me deixei envolver. já sem saber onde começava e onde terminava cada um dos papéis. sendo imparcial. sendo infiel às regras da peça. dispensando a maquilagem e os adornos de praxe. amador, sempre iniciante. se antes de aceitar o convite inesperado ao drama dançante, houvesse me prevenido com uma série de analgésicos, talvez fosse mais imparcial. mas aí o roteiro tomou outro rumo, o cenário virou primavera, saí inventando outras falas, cantarolava chico e tomava para mim o tempo das cenas. fui pelo cheiro, sempre o cheiro, de tudo o que sempre me vicia ao longo da vida. e de repente me faltaram as palavras. tive, então, que admitir: nunca fui bom ator. ainda que me aventure, vez em quando, com algumas atrizes. lançando olhares. testando-as. tornando-me um de seus amantes. sem posse, sem excesso, sem cólera. esqueço, quase sempre, os pseudônimos obrigatórios, bem assim as falas decoradas. e logo saio de cena. mas de tão natural, foi uma boa temporada, a última. alguma fotografia vinda da platéia talvez tenha tudo registrado. agora ao fim, deixo as minhas vestes no camarim e desfaço-me de mais uma lúdica fantasia. na saída, deparo-me taciturno, com uma garrafa de vinho e uma leveza de dever cumprido.

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